sábado, 30 de março de 2013

Os efeitos da fadiga no processo de tomada de decisão em tarefas desportivas



Os efeitos da fadiga no processo de tomada de decisão em tarefas desportivas - Araújo, D., & Esteves, P.
Laboratório de Psicologia do Desporto; Faculdade de Motricidade Humana; Universidade Técnica de Lisboa


Tomar decisões é orientar mudanças ao longo de um curso de interação com o contexto, visando um objetivo. Estas mudanças no curso de ação podem ter origem predominantemente no indivíduo (força muscular, intenção) ou no contexto (as linhas de jogo), mas resulta sempre da interação entre jogador e contexto (Araújo, 2005).

Daqui pode-se depreender que o comportamento decisional ao longo do jogo, não só incorpora a atualização do estado do contexto de jogo, como também do estado em que se encontra o indivíduo. Um dos aspetos do jogador que se altera com o decorrer do jogo é o nível de fadiga.
Nos desportos coletivos com bola assume-se a influência da fadiga quando se constata uma deterioração na produção de trabalho à medida que se aproxima o final do jogo. Esta inferência provém de estudos que compararam a distância percorrida entre a primeira e a segunda parte de jogos de futebol. Por exemplo, Bansgbo et al. (1991) relatam que a distância percorrida na 1ª parte de um jogo de futebol é 5% maior que na 2ª parte.
Todavia, o facto de se percorrer uma menor distância não implica necessariamente uma menor eficácia do desempenho.

O comportamento decisional enquanto sistema de ação:

Reed (1982, 1996) opôs-se à ideia do comportamento ser concebido como uma resposta mecânica a um estímulo. Pelo contrário, ele defendeu que o comportamento não é intrinsecamente mecânico, mas intrinsecamente funcional. As mesmas relações funcionais são realizáveis de múltiplas formas.

Um indivíduo pode, regra geral, estabelecer as mesmas relações funcionais com o seu ambiente de diversas maneiras, implicando para isso diferentes estruturas anatómicas. Este fenómeno é descrito como equivalência motora. Por exemplo, um jogador de futebol pode marcar um golo com um ou outro pé, com a cabeça ou com o peito.

Então, mas como podemos conceber o modo como o comportamento decisional orientado para atingir um objetivo é influenciado na fadiga?
Efeitos do exercício nos processos cognitivos
Parece contra-intuitivo os estudos de laboratório apontarem no sentido inverso aos inúmeros casos relatados sobre o decréscimo do desempenho do trabalhador, em que a razão é atribuída à fadiga. Porém, as extensas revisões dos referidos autores apontam para que cargas agudas de exercício facilitem seletivamente múltiplos processos cognitivos: o exercício pode melhorar a velocidade de resposta e a exatidão da resposta, pode facilitar os processos cognitivos envolvidos na resolução de problemas, bem como a “goal-oriented action” (Tomporowski, 2003). Em termos do tipo de esforço, vários estudos demonstram melhorias no desempenho cognitivo dos participantes durante e após períodos de exercício aeróbio realizado em intensidades moderadas. Exercício anaeróbio intenso não diminui o funcionamento cognitivo, exceto quando um indivíduo entra em desidratação ou vai para além de um estado de extrema depleção da energia armazenada. 



Como é que isto pode ser explicado?
Vários autores (Arcelin, 1998; Tomporowski, 2003), defendem que quando um indivíduo está empenhado em atingir um objetivo, a alocação de recursos cognitivo-energéticos para a tarefa permite que se mantenha a mesma qualidade do desempenho, mesmo durante exercício à máxima intensidade. Segundo Brisswalter et al. (2002), alguns estudos que utilizaram tarefas com exigências decisionais detetaram uma zona ótima de intensidade de exercício na qual há melhoria do desempenho cognitivo.

O atleta pode acumular fadiga no decurso de um jogo (o decorrer do jogo influencia o estado do jogador), como também o jogador à medida que acumula fadiga modifica o seu comportamento decisional em jogo (a fadiga influencia o decorrer do jogo), embora os níveis de relação funcional (eficácia) permaneçam estáveis ou até aumentem com o decorrer do jogo (Davids & Araújo, 2005).
[No entanto, os autores basearam-se em tarefas artificiais…]

Conclusão:
A tomada de decisão, independentemente do nível de experiência, foi mais exata com intensidades elevadas do que com intensidades baixas.
Em tarefas específicas do desporto, onde a exigência decisional é elevada, apesar da fadiga fazer-se sentir segundo a perceção dos jogadores, o desempenho manteve-se eficaz, ou até chegou mesmo a aumentar a sua eficácia.  

Num estudo de Royal et al. (2006) foi assumido que a especificidade da tarefa permitiria aos participantes peritos implementar estratégias de auto-controlo (focalização da atenção, controlo do arousal) e de auto-monitorização seletiva para otimizar o desempenho na tarefa específica do desporto (Kitsantas & Zimmerman, 2002). Estes autores previam que desta forma seria minimizada a probabilidade de um declínio no desempenho cognitivo à medida que a fadiga aumentava.
 
Importa perceber como o atleta auto-regula os seus sistemas funcionais de modo a atingir um objetivo, sob diferentes condições de fadiga.

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