quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Inteligência e conhecimento específico em jovens futebolistas de diferentes níveis competitivos

Costa, J.C.; Garganta, J.; Fonseca, A.; Botelho, M. - Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física - Universidade do Porto

Este estudo visa avaliar e comparar a inteligência geral e o conhecimento específico do jogo em jovens praticantes de Futebol segundo o nível competitivo.
Será que os jogadores que possuem maior inteligência geral evidenciarão um maior nível de conhecimento específico da sua modalidade? E relativamente à performance desportiva, poderá um melhor conhecimento do jogo contribuir, de alguma forma, para um nível de rendimento superior?

"Os jogos desportivos coletivos (JDC) caraterizam-se pela aciclicidade técnica, solicitações morfológico-funcionais diversas e intensa atividade psíquica, num contexto permanentemente variável, de cooperação-oposição, com uma importância capital dos aspetos estratégico-táticos, onde a tomada de decisão precede a execução.
Os inúmeros problemas surgidos no jogo obrigam o jogador a decidir e selecionar qual a solução mais consentânea com a situação, obedecendo aos princípios gerais do jogo através do conhecimento que possui do jogo. Os jogadores têm que saber o que fazer, para depois selecionar como fazer, utilizando a ação motora mais adequada ao problema. Assim, sem conhecer a essência do jogo e dos seus princípios táticos, não se pode aproveitar na plenitude os recursos técnicos.

Assim, o sucesso nos jogos táticos depende largamente do nível de desenvolvimento das faculdades percetivas e intelectuais dos atletas, especialmente em associação com outros fatores que determinam a performance.

Segundo Rink, French & Tjeerdsma e Garganta, no jogador experiente nos jogos desportivos, constata-se que a nível cognitivo ele possui:
1. conhecimento declarativo e processual mais organizado  e estruturado
2. processo de captação de informação mais eficiente
3. processo decisional mais rápido e preciso
4. mais rápido e preciso reconhecimento dos padrões de jogo (sinais pertinentes)
5. superior conhecimento tático
6. uma maior capacidade de antecipação dos eventos do jogo e das respostas do oponente
7. superior conhecimento das probabilidades situacionais (evolução do jogo).

Ao nível da execução motora evidenciam:
1. elevada taxa de sucesso na execução das técnicas durante o jogo
2. maior consistência e adaptabilidade nos padrões de movimento
3. movimentos automatizados, executados com superior exonomia de esforço
4. superior capacidade de deteção de erros e de correção de execução

Para Konzag, os desportistas com um elevado nível de desempenho em situação de jogo, possuem processos cognitivos de alto nível, nos quais a receção e elaboração das informações são mais rápidas e mais precisas.


Para a performance desportiva são destacados pela literatura dois tipos de conhecimento: o conhecimento declarativo e o conhecimento processual. Estes dois tipos de conhecimento diferenciam-se, sendo o "conhecer que" ou o conhecimento declarativo e o "conhecer como" ou conhecimento processual.
Segundo Thomas, French & Humphriest, o conhecimento declarativo pode ser definido como o conhecimento do regulamento da modalidade, aspetos das posições dos jogadores, estratégias básicas de defesa e ataque, enquanto o processual se refere às ações no decorrer do jogo.
Por outro lado, o conhecimento processual constitui a realização dum comportamento que dificilmente explicamos.

Alves e Araújo acrescentam que quanto mais complexas as decisões, mais os expertos se distinguem dos iniciados.
Segundo eles, a qualidade de decisão do atleta depende ainda do seu conhecimento declarativo e conhecimento processual específicos, das suas capacidades cognitivas e da competência da sua utilização.

Segundo Chi & Glaser, o conhecimento específico de uma determinada área tem importância decisiva na solução efetiva dos problemas que essa área de atividade apresenta, razão pela qual alguns estudos recentes têm incidido nas interações entre inteligência e conhecimento.

Neste estudo em particular, foram escolhidos dois grupos de praticantes, ambos sub-16 e sub-17. Um dos grupos (22 elementos) compete num nível competitivo superior, no Campeonato Nacional de Juniores B e treinam 6 horas semanais. O outro grupo (22 elementos) compete num nível competitivo inferior, no Campeonato Distrital da AFPorto e treinam 4,5 horas semanais. Ambas as equipas são da mesma área geográfica.

Para os testes de inteligência geral observou-se que o grupo que compete a nível inferior obteve melhores resultados. Mas nos testes de conhecimento específico foi o grupo que compete a nível superior que obteve melhores resultados.

Quanto a saber se os jogadores mais inteligentes noutras áreas do conhecimento também o são no desporto, a resposta encontrada aponta para que tal não se verifique

Conforme sustentam Williams & Davids, o conhecimento específico pode ser mais um requisito do que uma aquisição prática através da exercitação. Em estudo com futebolistas experientes, concluíram que o conhecimento declarativo é um pressuposto importante dos jogadores de elite e não resultado de elevada experiência, ou exposição ao contexto desportivo. Segundo Greco, o nível de conhecimento tático superior apresentado pelos atletas de clube pode justificar-se pelas exigências competitivas, bem como pela importância da componente tática do treino.
De acordo com Williams & Davids, o maior nível de conhecimento dos jogadores mais experientes deve-se também à prática desportiva e não apenas à instrução. Em suma, também defendem que os atletas mais experientes possuem um conhecimento específico da modalidade mais amplo, permitido-lhes identificar e valorizar determinadas situações e/ou soluções.

Brito & Maçãs, compararam alunos de nível competitivo (federados) com alunos do desporto escolar e chegaram à conclusão que os jogadores federados possuíam um conhecimento declarativo (o que fazer) superior, reforçando a tese de que os atletas de melhor nível possuem um conhecimento mais elevado do que os seus colegas de nível inferior.


Conclusões:

1. Os jogadores do mesmo nível competitivo diferem entre eles, em relação à inteligência geral e conhecimento específico do jogo;
2. Os jogadores de nível competitivo inferior prevalecem sobre os de nível competitivo superior na velocidade percetiva e atencional, fator geral de inteligência, capacidade de concentração e exatidão;
3. os jogadores com maior experiência e nível competitivo mais elevado apresentam um superior conhecimento específico do jogo.


Garganta: "De facto, à luz das exigências do desporto actual, não basta chegar mais longe, nem saltar mais alto, nem ser mais forte, é preciso ser mais rápido, mais veloz. Mais rápido, não apenas a chegar ao local desejado, ou a realizar uma ação mas também a pensar, a encontrar soluções, a perceber o erro, a descodificar os sinais do envolvimento. Em síntese, mais rápido e melhor, a perceber, a pensar e a agir"