retirado de: Futebol, organização do jogo (Jorge Castelo)
O
exercício é o meio (ferramenta) fundamental do treinador, para que este possa
definir, direcionar e modificar o processo de formação e desenvolvimento, ou
seja, de transformação dos jogadores, sem o qual não é possível que estes
respondam de forma adequada e eficaz às exigências que a competição em si
encerra.
A estrutura dos exercícios de treino:
O exercício de treino depende da qualidade de resposta às seguintes questões:
- Que objetivos se pretende atingir?
- Que conteúdos técnicos, táticos, físicos, etc, se pretende aprender, aperfeiçoar ou desenvolver?
- Que formas de organização dos conteúdos estabelecidos se deve utilizar para alcançar aqueles objetivos?
- Que nível de performance se deve observar para que o exercício tenha atingido o objetivo pretendido?
Componentes estruturais
do exercício de treino:
Plano
Fisiológico (5
variantes):
- Duração do exercício (tempo que demora a executar um exercício)
- Volume do exercício (quantidade de carga)
- Intensidade (exigência do exercício)
- Densidade (relação entre carga-exercício ou séries de exercícios)
- Frequência (número de repetições)
Plano
Tático-Técnico
Número:
Ao
diminuirmos o número de jogadores envolvidos num exercício aumentamos
claramente as possibilidades destes serem solicitados para a execução das ações
programadas. A redução do número de jogadores irá aumentar o número de vezes
que estes podem relacionar-se.
Espaço
Ao
diminuirmos o espaço, maiores serão as dificuldades encontradas pelos jogadores
na concretização dos objetivos consubstanciados pelos conteúdos dos exercícios
de treino. Este facto deriva de quanto menor for o espaço, menor será o tempo
que os jogadores possuem para analisar a situação e executar as ações técnicas
correspondentes à sua solução, o que implica consequentemente um aumento da
velocidade e do ritmo de execução das ações individuais e coletivas, diminuindo
a eficácia estabelecida para a concretização dos objetivos propostos. Neste
sentido, “há que adequar o espaço de forma precisa, visto que entre o espaço e
a atividade desenvolvida pelos praticantes existe uma relação direta e precisa”
(Queiroz, 1986)
Tempo
“a
resolução eficaz das situações de jogo é consequência de dois parâmetros
fundamentais: “a velocidade com que se encontra a solução do problema, e, a
adequação dessa solução a essa mesma situação (Mahlo, 1966). A rapidez e a
adequação são duas qualidades que interagem em sentidos inversos. Isto
significa que a solução dos problemas postos pelo jogo, é tanto mais adequada,
quanto o jogador pode refletir essa situação durante mais tempo. Se
considerarmos o tempo reduzido que o jogador dispõe para resolver durante o
jogo os problemas postos, torna-se claro que a atividade no seu conjunto, não
pode atingir a correção absoluta. Logo, é o grau de adequação de cada uma das
ações no seu seio da atividade coletiva global que carateriza o nível tático de
um jogador e, em definitivo, de uma equipa.
A
invariável tempo está estritamente ligado ao espaço: “Quanto mais tempo tiver
para agir, maior margem de erro é possível por parte do jogador. (Queiroz, 1986
cit. Schon, Helmut) refere que: “o rendimento de um jogador está diretamente
relacionado pelo factor tempo e pelo factor espaço, isto é, a eficácia técnica
depende de um complexo de variáveis técnicas e táticas desenvolvidas em
competição que podem, ou não, perturbar o jogador quando se o pressiona pelo
tempo e se o priva de espaço”.
Complexidade
A
complexidade da situação representa as condições de execução, ou seja, o
conjunto de condicionantes que irão fundamentar as razões da opção de um certo
comportamento em detrimento de outros e que deverá ser o mais adaptado à
situação competitiva.
A
relação estabelecida entre o número-espaço-tempo determinam, consequente e
continuamente um certo grau (nível) de complexidade que poderá ser aumentado ou
diminuído consoante as modificações operadas numa ou mais invariantes e do grau
de alteração das relações estabelecidas entre estas.
Clemente, F.;
Couceiro, M.S.; Martins, F.M.L.; Mendes, R. – The usefulness of small-sided games on soccer training.
Journal of
Physical Education and Sport (2012)
Os resultados deste estudo sugerem que a intensidade do exercício pode
ser manipulada pelos treinadores, através de condicionantes estruturais. Ao
mesmo tempo, os treinadores podem aumentar a qualidade tática e técnica através
das mesmas condicionantes, através da especificidade: “the coaches
try to emulate the physical, technical and tactical requirements, adapting the
task to specificity of the game, reducting its forms and adapting training
objectives (MacLaren, Davis, Isokawa, Mellor & Reilly, 1988; Hoff, et al.,
2002; Reilly & White, 2004; Mallo & Navarro, 2008)
Muitos estudos examinaram a relevância e a influência das condicionantes estruturais dos exercícios (espaço, número de jogadores, colocação dos alvos e comunicação/feedback do treinador) na intensidade dos jogos simplificados/reduzidos. (Owen, Twist & Ford, 2004; Rampinini, et al., 2006; Jones
& Drust, 2007).
Muitos estudos revelam que o área de jogo influencia o número de contactos com a bola e o tipo de passes efetuados pelos jogadores. (Jones & Drust, 2007;
Casamichana & Castellano, 2010).
Da mesma maneira, o número de jogadores em jogos reduzidos/simplificados influencia as ações técnicas realizadas pelos jogadores (Katis &
Kellis, 2009; Rudolf & Václav, 2009).
Mas lembre-se:
O mesmo exercício pode não resultar da mesma maneira em duas equipas diferentes, ou em dois momentos diferentes da época desportiva.
Assim, o treinador precisa de usar múltiplas condicionantes para adaptar os jogos reduzidos/simplificados para alcançar os objetivos
Especificidade
A
introdução de exercícios específicos depende de fatores associados ao contexto de
equipa e dos seus objetivos. Fatores como, as capacidades condicionais dos
jogadores, a fase da época, o tempo de recuperação antes ou depois do jogo,
objetivos estratégicos da equipa, nível técnico dos jogadores, nível de
desempenho coletivo são fatores que devem ser considerados até ao momento de
designar os exercícios de treino.
A adequação da especificidade do exercício ao
contexto é um fator chave que poderá levar ao sucesso. (Clemente, F. et al., 2012)
Número de Jogadores
O
número de jogadores no campo, nos jogos reduzidos/simplificados pode
influenciar a intensidade e os efeitos fisiológicos do jogo.
O
número de jogadores em cada jogo influencia a intensidade do jogo e a frequência
de contactos com a bola.
Geralmente,
autores observam um aumento na resposta cardiaca (frequência cardiaca) nos
jogos reduzidos/simplificados, usando menos jogadores. Quanto menor o número de
jogadores, maior a intensidade de jogo (Rampinini et al., 2007)
Adicionalmente,
foi possível analisar que a média da frequência cardíaca reduz-se gradualmente
ao mesmo tempo que aumentamos o número de jogadores. Contrariamente e ao mesmo
tempo, à medida que o número de jogadores é mais baixo, o número de contactos
com a bola por cada jogador aumenta. (Clemente, F. et al., 2012)
Quanto
menor o número de jogadores maior poderá ser o contacto de cada jogador com a
bola. (Balsom, 1999)
Na prática...
O
número de jogadores pode modificar as exigências de cada jogador. Quanto menor
o número de jogadores maior a intervenção de cada um no jogo, reduzindo a
variabilidade das possibilidades de passes.
Usando
a forma jogada 8x8 e a de 4x4, Jones and Drust (2007), concluíram que o número
de contactos com a bola é superior na forma jogada com menos jogadores.
É
possível observar que quanto menor o número de jogadores nos jogos
reduzidos/simplificados, mais oportunidades para aumentar a frequência de
skills. Na verdade, o aumento do número de jogadores nos jogos reduzidos deve
estar de acordo com a especialização e fase de aprendizagem dos jogadores. São
recomendados menos jogadores nos jogos reduzidos para jogos entre alunos de
nível mais baixo de especialização. Com o aumento da qualidade, com o aumento
do nível de especialização, recomenda-se também o aumento do número de
jogadores em cada jogo reduzido/simplificado. (Clemente, F., 2012)
Área de jogo
Physiological
and Kinematical Effects
Treinadores
podem adaptar a intensidade do treino pela variação na área de jogo. (Tessitore,
Meeusen, Piacentini, Demarie & Capranica, 2006).
Basicamente,
o espaço para progredir com bola e as suas ações de suporte estão relacionadas
com o espaço entre jogadores bem como com o espaço livre para tomar decisões.
Neste sentido, o jogador pode estar constrangido pelas dimensões do campo.
Espaços com pequenas dimensões podem promover mais mudanças de comportamento e
aceleração. Por outro lado, espaços com grandes dimensões fazem com que os
jogadores tenham mais tempo para decidir.
Na
prática…
O
tamanho da area de jogo pode ser uma importante condicionante usada pelo
treinador para obtenção dos seus objetivos. De facto, a frequência de skills,
por cada jogador é um importante fator de desenvolvimento da sua relação
relação com a bola e suas competências técnicas de jogo. (Clemente, F., 2012)
As
dimensões do campo podem diminuir ou aumentar a distância entre jogadores.
Essas distâncias podem determinar a frequência de habilidades técnicas por
parte dos jogadores. Maiores distâncias entre jogadores da mesma equipa podem
ajudá-los a realizar passes porque os adversários ficam mais distantes do
jogador portador da bola. Em campos mais pequenos, com tamanho mais reduzido a
distância entre jogadores da mesma equipa ajuda a fazer passes mas estes podem
não ter a mesma eficiência porque os adversários estão mais próximos e por
consequência, podem intercetar a bola. (Clemente, F.,
2012)
Colocação dos alvos
Os
constrangimentos da tarefa são um importante fator que podem ser usados para
manipular a relação, interação e respostas do jogador num dado contexto. (Araújo,
Davids & Hristovski, 2006).
As
condicionantes podem restringir e aceitar múltiplos comportamentos que o
sistema pode adotar. (Davids, et al., 2008). Especificamente, constrangimentos
relacionados à tarefa que podem ajudar os jogadores a centrar a sua perceção em
informação muito específica. (Handford, et al., 1997)
A
inclusão do guarda-redes modifica o comportamento dos jogadores a nível tático
e físico. A tarefa com guarda-redes mostra menos intensidade (menor frequência
cardíaca média) e menor distância percorrida pelos jogadores. Na tarefa com
guarda-redes os jogadores tentam organizar defensivamente a sua equipa no
sentido de proteger a sua baliza. Isto tem influência no jogo. (Mallo
and Navarro, 2008)
(Duarte
et al., 2010) manipulou 3 condicionantes ligadas à tarefa:
i)
Uma
“pointline”, que tem que ser ultrapassada através da condução de bola;
ii)
2 balizas nos corredores laterais;
iii)
1 baliza central;
Os
resultados sugerem que a variabilidade da frequência cardíaca associada à “pointline”
é mais baixa do que aquela que está associada a ambas as balizas e/ou a uma
única baliza.
São
vários os estudos que sugerem que as condicionantes estrutrurais, tais como, as
dimensões do terreno de jogo e o número de jogadores promovem diferenças nos
jogos reduzidos. Antes de implementarem os exercícios e as suas condicionantes,
os treinadores precisam de considerar primeiro o nível dos seus alunos e o
contexto. Consecutivamente, o
treinador precisa de considerar, em primeiro lugar, o objetivo do exercício e
só depois manipular as condicionantes para que o exercício alcance o seu
objetivo.