Portugal, País de fraca cultura desportiva, onde desporto é pouco mais do que futebol.
Hm... Pois, mas enganem-se todos aqueles que pensam que no futebol tudo está bem. A verdade é que o futebol português tem vindo a ter resultados extremamente positivos. Mais equipas presentes nas principais competições europeias, bons resultados daquela que é a nossa bandeira (seleção nacional de Futebol).
Mas não se avizinham bons ventos, pelo menos enquanto não se introduzirem novos pensamentos, novas ideologias.
E no capítulo da formação, posso dizer-vos que ainda está tudo por fazer!
São muito poucos os clubes e instituições que olham, pensam a formação como projeto a médio e longo prazo. Quem monta um clube, quer resultados para ontem, quando na realidade, os resultados ditam pouco mais do que, números, altamente manipulados que não traduzem, na maior parte das vezes, a real competência das crianças/jovens praticantes.
Todavia e infelizmente, ganhar é demasiado importante mesmo no escalões mais baixos...
Sim, estou a ser irónico...
A verdade é que não me lembro se o Figo, Rui Costa, Cristiano Ronaldo, Nani, Ricardo Quaresma, Simão, Bruno Alves, João Moutinho e tantos outros, foram alguma vez campeões no escalão de Benjamins, Infantis e Iniciados. Alguém se recorda?
Mas infelizmente, ganhar é demasiado importante mesmo nos escalões mais baixos...
Lembro-me de uma tal Associação Desportiva e Cultural da Adémia vencer alguns campeonatos distritais de Juvenis e Juniores (AFC) há 10 anos atrás. Mas alguém se recorda? Talvez os diretores dessa mesma instituição, mas o comum dos adeptos, apenas sabe que nessa Associação foi formado um dos atuais avançados do Sporting Clube de Braga e da seleção nacional. Estou a falar de Éder.
Hoje vive-se o futebol de formação da mesma forma como se vive o futebol-espetáculo-negócio-rendimento dos séniores.
Devemos tratar as crianças como mini-adultos?
Devemos colocar nas crianças essa pressão?
Devemos obrigar a criança a jogar nas mesmas formas jogadas dos adultos (11x11)?
Qual é a lógica?
Nós na escola primária aprendemos a tabuada, não aprendemos a Física e as Análises Matemáticas de alguns cursos do Ensino Superior. A criança-jogador não está preparada para um desafio tão ambicioso. Desta forma precisa de estímulos mais adequados, para que possa desenvolver a sua inteligência, para melhorar a sua perceção e compreensão do jogo.
Os alunos desde tenra idade devem portanto ser estimulados a pensar e a terem as suas próprias iniciativas sem medo de errarem. Os formadores e treinadores devem criar as condições ótimas para que a criança-jogador possa desenvolver todas as suas potencialidades e tomar as suas decisões sem que estas sejam punidas caso delas não resulte a melhor solução.
Os alunos devem jogar num ambiente ótimo de aprendizagem, onde a liberdade e a descoberta guiada devem estar sempre presentes. Só assim o treinador promove o desenvolvimento da criatividade, autonomia e iniciativa.
Por isso, é importante que a criança possa jogar num ambiente sem treinador, sem árbitro, um pouco à imagem do futebol de rua de outrora, onde a criança descobria o jogo e aprendia a ser criativo.
A relação treinador-aluno não deve ser igual à relação médico-paciente. O médico prescreve. O treinador deve orientar, mas não deve nunca impor seja o que for.
Muitos campos de futebol são dominados por instrutores, o que leva a um reduzido desenvolvimento da criatividade/inovação dos seus atletas. Estes treinadores, com "resultadofobia" impõem o seu manual de soluções aos seus alunos, entregando-lhes os "quê's" e os "comos".
Estimulámos a criança-jogador a pensar?
Apresento-lhe a seguinte analogia:
Imaginem que o vosso filho está a fazer uma
prova de Português, Matemática, Inglês ou outra disciplina qualquer.
Este momento servirá para apurar as aprendizagens do vosso filho a uma
determinada temática.
Se o aluno for autónomo, ele irá errar e iremos apurar o seu verdadeiro conhecimento. (É evidente que pode haver outras variáveis: concentração, ansiedade, etc).
Se o aluno for autónomo, ele irá errar e iremos apurar o seu verdadeiro conhecimento. (É evidente que pode haver outras variáveis: concentração, ansiedade, etc).
Então mas o que acontecerá se este aluno tiver a ajuda do professor? O
que acontecerá se o professor lhe comunicar algumas/todas as respostas,
ele irá estar muito mais próximo da perfeição no momento, mas certamente
que chegaremos à conclusão de que as aprendizagens por ele realizadas,
nunca vão ser as mesmas...
O treinador deve portanto dar liberdade a todos alunos para que possam descobrir as melhores decisões para cada contexto e situação.
Mas como é possível explicar tal conceito a um País sem cultura desportiva, que não consegue dissociar entre uma criança e um adulto?
Como é possível tudo isto se para o comum do espetador a postura observadora e de análise do técnico/treinador/formador é interpretada como falta de motivação ou incompetência.
Ora, o problema é cultural e popular...
Mas do popular também bebemos o seguinte provérbio:
"não dês o peixe, dá antes uma cana e ensina-lhe a pescar!"
Extinto este incêndio da falta de liberdade e da falta de iniciativa, penso que estarão reunidas as condições para tentarmos perceber a relação direta entre desenvolvimento da técnica e desenvolvimento da inteligência.
O Futebol atual é um jogo dotado de enorme imprevisibilidade, um ritmo acelerado que requer dos jogadores um empenho permanente para tomarem decisões. São exigências elevadas que obrigam os jogadores a
observarem, processarem e avaliarem as situações, e ao mesmo tempo
elegerem a melhor solução para surpreender o adversário tanto técnica,
quanto taticamente.
Para a concretização da ação é exigida uma elevada capacidade de leitura
de situações e tomada de decisão instantânea, mais, é necessário que da
leitura da situação seja "escrita" a solução. Por isso, quanto mais
recursos motores específicos o jogador possui ou desenvolve, maior é a
probabilidade de obtenção de sucesso na ação de
"escrever" a solução.
A técnica é portanto um fator decisivo que permite aos melhores
executantes desempenhos superiores em situações de jogo. Os jogadores
com repertório mais amplo têm uma maior variabilidade técnica e poderão
alcançar no futuro níveis excelentes de rendimento desportivo.
Ainda assim, neste capítulo é importante destacar que o ensino não se pode transformar em uma
aprendizagem mecânica de gestos técnicos, restringindo-se às componentes
biomecânicas da execução, mas, sobretudo, à escolha e ajuste do gesto à
situação que se apresenta, uma vez que o contexto será relevante para o
aprendizado.
O que se pretende a partir dessa ideia é que a aprendizagem das habilidades técnicas seja parte integrante de contextos com tomada de decisão, onde o que importa está contido na situação de jogo. Só assim os praticantes serão capazes de resolver os problemas que o contexto específico lhes coloca.
O que se pretende a partir dessa ideia é que a aprendizagem das habilidades técnicas seja parte integrante de contextos com tomada de decisão, onde o que importa está contido na situação de jogo. Só assim os praticantes serão capazes de resolver os problemas que o contexto específico lhes coloca.
O que devemos melhorar e como devemos fazê-lo?
Especificidade!
Fases do ensino do jogo
"O jogo de futebol é uma realidade complexa porque o jogador tem que, a um tempo, relacionar-se com a bola e referenciar a sua situação no terreno de jogo, a posição dos colegas, dos adversários e das balizas. Devido a esta complexidade, impõe-se que o seu ensino seja gradual: do conhecido para o desconhecido, do fácil para o difícil, do menos para o mais complexo. Até chegar aos problemas do jogo formal, há que resolver um conjunto de situações passíveis de hierarquização, em função da estrutura dos elementos de jogo: jogador, bola, balizas, colegas e adversários.
Somos portanto apologistas dum ensino do Futebol referenciado a fases evolutivas, ou etapas, que permitam integrar tarefas e objetivos de complexidade crescente. Todavia, a necessidade de dividir o ensino em fases não deve conduzir à divisão do jogo em elementos (passe, condução de bola, remate, etc.), mas antes à sua estruturação em unidades funcionais.
Fase 1: construção da relação com a bola
Fase 2: consciencialização dos alvos (balizas)
Fase 3: construção da noção de oposição
Fase 4: construção da noção de cooperação
"O jogo de futebol é uma realidade complexa porque o jogador tem que, a um tempo, relacionar-se com a bola e referenciar a sua situação no terreno de jogo, a posição dos colegas, dos adversários e das balizas. Devido a esta complexidade, impõe-se que o seu ensino seja gradual: do conhecido para o desconhecido, do fácil para o difícil, do menos para o mais complexo. Até chegar aos problemas do jogo formal, há que resolver um conjunto de situações passíveis de hierarquização, em função da estrutura dos elementos de jogo: jogador, bola, balizas, colegas e adversários.
Somos portanto apologistas dum ensino do Futebol referenciado a fases evolutivas, ou etapas, que permitam integrar tarefas e objetivos de complexidade crescente. Todavia, a necessidade de dividir o ensino em fases não deve conduzir à divisão do jogo em elementos (passe, condução de bola, remate, etc.), mas antes à sua estruturação em unidades funcionais.
Fase 1: construção da relação com a bola
Fase 2: consciencialização dos alvos (balizas)
Fase 3: construção da noção de oposição
Fase 4: construção da noção de cooperação
Construção das situações de ensino e treino
Deverá ser solicitada e estimulada a adaptabilidade em situações simultaneamente ajustadas ao nível de desenvolvimento do praticante e às exigências do jogo.
É aconselhável que se recorra a um conjunto de variáveis, cuja utilização permite induzir transformações na configuração dos exercícios, bem como nos comportamentos e atitudes dos jogadores. Algumas dessas variáveis podem ser: bolas (com diferentes tamanhos), balizas (com diferentes dimensões), espaço de jogo (adequado às caraterísticas dos praticantes), número de jogadores (formas jogadas adaptadas), regras, outras... "
Deverá ser solicitada e estimulada a adaptabilidade em situações simultaneamente ajustadas ao nível de desenvolvimento do praticante e às exigências do jogo.
É aconselhável que se recorra a um conjunto de variáveis, cuja utilização permite induzir transformações na configuração dos exercícios, bem como nos comportamentos e atitudes dos jogadores. Algumas dessas variáveis podem ser: bolas (com diferentes tamanhos), balizas (com diferentes dimensões), espaço de jogo (adequado às caraterísticas dos praticantes), número de jogadores (formas jogadas adaptadas), regras, outras... "
Garganta, J. (2002) - Universidade do Porto, Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física
Direto e objetivo!
O real problema da formação desportiva
"Os problemas nesse processo surgem quando o treino e a participação
competitiva de crianças e jovens tendem a reproduzir e a adaptar os
conhecimentos e as formas de organização do desporto de alto rendimento,
quando a valorização e o reconhecimento social dos mais jovens se
preceituam através dos resultados competitivos e quando a vitória nas
competições continua a ser o objetivo principal para muitos treinadores,
dirigentes e pais.
Nesses casos há uma reversão lógica da formação, porque a procura do rendimento imediato impõe estratégias de treino que produzem resultados em curto prazo, comprometem os resultados futuros e frustram expetativas de crianças e jovens."
Nesses casos há uma reversão lógica da formação, porque a procura do rendimento imediato impõe estratégias de treino que produzem resultados em curto prazo, comprometem os resultados futuros e frustram expetativas de crianças e jovens."
By Costa, I., Greco, P., Garganta, J., Costa, V., Mesquita, I. (2010) , Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte